Foto: Guilherme Gonçalves - Julho 1998
ENGENHO VELHO
Engenho velho e triste, inválido troféu,
Com paredões de pedra e travas colossais
- Mastodonte de taipa, a dormir sob o céu,
Relembrando o Brasil dos tempos coloniais!...
Essa mole rural de peroba e cabreúva,
Erguida pelas mãos dos pobres africanos,
De cumieira selada aos embates da chuva
- Resiste bravamente ao peso dos cem anos!...
No seu bojo em silêncio, entram résteas de sol
E onde a velha fornalha irradiava clarões,
O mato rompe hostil, se arrasta o caracol
E a força da enxurrada escavou socavões.
A tosca chaminé, hirta no velho aprumo,
Caducando, senil, no maior dos sossegos,
Em vez de se enfeitar com penachos de fumo,
Guarda teias de aranha e nuvens de morcegos.
No tendal alagado, entre cochos vazios,
Onde outrora se ouvia o cantar dos "banqueiros",
Na calada da noite, em recantos sombrios,
Coacham com tristeza os sapos carpinteiros...
E esse engenho que vem dos idos tempos bravos,
Imerso, como está, nesse extremo torpor
Foi a angústia sem fim do mundo dos escravos
E a grandeza fugaz do ríspido senhor...
Na barroca perdido, ao sabor da erosão
A se diluir nos tons da mata que o encerra,
Ninguém mais pensará que esse torvo aleijão
Foi um dia na vida - o poder de uma terra.
Engenho, o teu viver na existência passada
Ainda ecoa em clamor de antigos sofrimentos
Na noite tropical, quando canta a nortada
Na velha escuridão dos teus travejamentos!
No teu poente sem luz, só te resta e alumia
Como em tempo distante, o mesmo azul do céu
- És a tumba de taipa a guardar com poesia
O despojo brutal de um mundo que morreu!...
João Campos Filho - Zico Láu - 1941
Foto: Guilherme Gonçalves - Julho 1998
Foto: Guilherme Gonçalves - Julho 1998
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